Cacá diz, por email, que "Into the wild", o filme do Sean Penn, é um exemplo do que não devemos fazer. Sem ter visto o filme, apenas o trailer, consigo imaginar o que ela quer dizer. Tenho a impressão que há um clima de "lição de moral" no filme, que definitivamente não quero para "Como as ondas". Mas na verdade não sei se é disso que ela está falando.
Um filme controverso mas que certamente tem uma coisa ou duas a ver com o nosso é "Quatro meses, três semanas e dois dias". Já faz um certo tempo que voltou à moda no cinema essa coisa do "tempo extendido", essa busca em alongar a cena em busca de uma determinada sensação de esgotamento do espectador. Esse procedimento tem aparentemente a ver com um registro mais realista, e não por acaso muitos dos cineastas que o praticam tiveram suas origens no documentário.
Na primeira conversa com a Cacá conversamos um pouco sobre isso. Particularmente tenho muitas ressalvas com esse tipo de cinema. Não tenho certeza se isso funciona sempre, e se a sensação de desconforto gerada no espectador é realmente benéfica para as intenções do filme, ou é apenas uma impertinência do diretor. Mas há toda uma linha de cinema sendo praticada na Europa seguindo essa tendência.
"Quatro semanas..." não foge inteiramente a essa corrente. E, em muitos momentos, se revela uma cópia mal feita de outros cineastas como os irmãos Dardenne, por exemplo. Mas em um ou dois momentos propõe uma nova forma de explorar a extensão do tempo.
Nesses momentos, que considero geniais, o diretor cria cenas absolutamente estáticas, câmera parada, mise-en-scene contida. São cenas longas, que ele preenche com uma intensa ação subjetiva (se é que existe esse termo). Ao longo da cena, somos levados a imaginar uma outra ação, uma outra realidade muito distante do que está acontecendo à frente da câmera. E se cria então uma tensão insuportável entre um quadro rígido e uma paisagem imensa que é criada "por trás" da cena, como por exemplo na descrição monocórdica que o homem faz do processo do aborto, ou na mente da personagem principal sentada à mesa do jantar. Essa tensão sim é valorizada pela extensão da cena, como se o mundo imaginado fosse crescendo segundo a segundo, ameaçando romper de forma explosiva com a situação estática proposta no quadro.
Talvez esteja aqui o ponto principal que quero ressaltar: a extensão do tempo usada como forma de ampliar a tensão da cena, e não de exaurí-la.
Esse conflito entre rigidez e liberdade permeia todo o filme, e se, em muitos momentos, ele se perde com recursos gratuitos e até apelativos, nessas cenas consegue concentrar o conflito principal de forma absolutamente cinematográfica. E nos cria um quadro rico, recheado de significados e de intenções, que nos levam a cada vez mais dúvidas, e menos respostas.
sexta-feira, 29 de fevereiro de 2008
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